Percebo como fundamental e enriquecedor o diálogo entre os países de língua portuguesa.
Ricardo Riso
Fragmentos do léxico de uma poesia doutrinária
Ensaio sobre o livro Lex & Cal Doutrina, de Lopito Feijóo
Há um jogo metafórico, na poesia de Lopito Feijóo, uma mensagem camuflada que tem uma disponibilidade en los legatos de interpretar, criticamente, a realidade.
Xosé lois Garcia
(investigador)
Muito foi dito, redito, mas para este “Lex & Cal Doutrina”, de Lopito Feijóo, remete-nos a uma profunda reflexão, no que tange ao uso do próprio léxico, aliás, este é, sem dúvida alguma, o propósito primordial desta obra. A separação das palavras em versos diferentes, dotando-as, cada uma em dois versos, cria, até certo ponto uma inibição logo a priori, mas que ao longo da exposição psicológica que as figuras nos remetem, vão se formando e ilustrando as imagens num sentido figurante, fazendo das palavras uma escultura da própria palavra, num sentido artístico do próprio léxico. Esta vanguarda de reinvenção vai até no íntimo quebrar a doutrina morfológica da palavra, rompendo não só com as regras, mas até o profundo sentido da significação da palavra em si.
FULANA
PAIXÃO
É
ter na
mente
terno crepitante
móveis texturas
duas
leve duras stendo
se à tona
da
doce fulana
paixão inter
posta
inteira mente
eterna mente
mente que não mente.
(pag. 16)
A concepção inovadora, provavelmente única, de tratar a própria palavra, tal e qual um escultor maconde na sua labuta quotidiana ao pau-preto, remete-nos a estabelecer analogias, sem propriedade categórica, pois, os laivos da (re)invenção deste “Lex & Cal Doutrina” produzem na fonografia, se me permitam, um novo neo-concretismo, com tendências similares à poesia concreta brasileira, traços verosímil apontam a poetas como por exemplo Ferreira Gullar.
Pode dizer-se que, metaforicamente, Lopito Feijóo descobre, aqui, mais um dos vastos territórios da superfície poética, território este que na primeira apreciação o leitor vê na condição de um turista mal informado, ignorando todas as potencialidades do léxico doutrinal, mas quando esta visita torna-se constante, o belo revela-se na sublime racionalidade da construção lexical, destas vivas vivências que o escultor de palavras, Lopito Feijóo, propõe-nos. O muito foi dito, mas para percepção do conteúdo poético aqui exposto, aliás, destas figuras tecidas dentro da própria palavra, obrigam-nos ao mesmo exercício tal e qual a labuta de um escultor maconde.
A transcendência piscopoética tem aqui, nestes mares de letras pré-seleccionados, um oceano de conteúdo poético, como oceano, com suas riquezas e mistérios, que requer arduamente a capacidade do leitor desvendar os segredos deste oceano, se comparados às gotas e o conteúdo poético de cada verso aqui reinventado.
Esta obra é realmente uma descoberta de quão a palavra pode significar e dar significados diferentes, quando reinventamos a morfologia.
O facto de, a obra, vir servida em três imensas (imensidade qualitativa) subdivisões: Lexical Doutrina, Memorial Doutrinário e Eros Doutrinários, do conteúdo poético aqui abordado, obriga o leitor a mais um esforço peregrino na concepção, que se diga: a mesma transpiração que o poeta usa e ousa, deve ser a mesma no leitor para decifrar os signos dessa densa linguagem que o “Lex & Cal Doutrina” nos traz.
Feijóo a parece aqui, não como uma criança na noite, com medo de escuro, mas como a própria noite com escuro, medo, curiosidades e ocultismos por desvendar, como um poeta angolano, que não deixa em nenhum momento a originalidade do tradicionalismo (angolanidade), como justifica o poema dedicado ao seu mestre Luandino Viera, intitulado:
Das estradas do céu e do canto do grilito
Gri…gri…gri…
Ngasakidila kanzenze
Insunji mano insunji
Ku diulu dia dikanu dié
Ngamono jitetembua
Ni mukengêji iazele
Dia kutululuka kuetu.
(Pag. 49)
Os factos sociais do passado e do presente, guerras sofridas, corrupção, fome, miséria, e muito mais, tem nessas entrelinhas um destaque quase que explícito, aliás, como nos ensina Cícero, não conhecer o passado é permanecer criança, Lopito usa este passado, e vem como à voz das vozes que não se ouvem na labuta árdua do quotidiano subdesenvolvido, e em alguns traços depõe como testemunha ocular dessa África que lhe vive. É sem escrúpulos um poeta, que poetiza as vivas e duras vivências africanas, com muita transpiração, que se diga: felizmente consegue transmitir veementemente as imagens desta angolanidade usando a poesia como a fotografia fiel destas convivências.
Japone Arijuane
Nenhum comentário:
Postar um comentário