segunda-feira, 4 de abril de 2011

A POESIA EPIGRÁMATICA DO AMIN NORDINE OU A BABALAZE DO ATIRADOR DAS VERDADES

A POESIA EPIGRÁMATICA DO AMIN NORDINE OU A BABALAZE DO ATIRADOR DAS VERDADES

Um poema assim é arduo/ sem cola e na vertical/ pode levar uma eternidade.
ARMENIO VIERA

Ao Sangari Okapi e Lúcilio Manjate                                

                                                          ERNESTO MULHANGA*

Amin Nordine nasceu em Maputo aos 17 de fevereiro de 1969 e perdeu a vida aos 5 de fevereiro de 2011. Autor de apenas 3 livros, o que não tem importância porque a literatura não se assemelha a uma competição onde quem publica muitas obras sai vencedor, assim sendo existem escritores que têm sido felizes nesta maratona aliando a quantidade versus qualidade como o seu cavalo de batalha e tem se notabilizado como verdadeiros campeões (ex: Mia Couto, Antonio L. Antunes, Pepetela, Moacyr Scliar…), bastando lembrar do Luis B. Honwana, Noemia de Sousa, Gulamo Khan e Lilia Momplé para sustentar a tese de que qualidade nem sempre rima com a quantidade.

Publicou Vagabundo Desgraçado (1996), Duas Quadras para Rosa Xicuachula (1997) e Do lado da ala-B.
 
Amin Nordine é militante de uma escrita sólida em todos os lados, seja o da ala-A ou da ala-B. Isenta de qualquer submissão política, caracterizada pelo inconformismo da realidade que o circunda e pela revolta social, esta poesia epigramática é a revelação de um fatalismo que voa em voo rasante sobre as angústias de um passado melancólico e de um presente envenenado.

“E do futuro o que se espera? O futuro não sera isto!… superlotada receita galgando o vento/com as mãos no coração do destino.”

O que é do lado da ala-B? O leitor descobrirá que está no lado mas vil de um jovem país com os seus problemas, e é neste lado onde reside o poeta solitário nas suas abordagens anti-heroicas, mas das multidões na sua mordacidade social, um verdadeiro maquinista do comboio dos duros, um autênctico vômito da babalaze de um poeta bebȇdo do seu dia-a-dia. Detentor de uma caligrafia rebelde com versos quentes como o fogo e cortantes como  a espada afiada, onde eclodem temáticas de afrontamento de um certo tempo histórico (ex: carta ao meu amigo Xanana, banqueiros de banquetes, bandeira galgada aos 25, (c)anibalizinhos…)

Talvez o outro lado da ala destes poemas,não! Isto ultrapassa a dimensão poética, ou por outra destes melancólicos dissabores que despertam os filhos desta pátria que nos pariu, deste manancial de barbaridades versus mentiras
que trasformam o sonho de estar livre da opressão em um pesadelo. Não será esta a voz do povo?

Estes melancólicos dissabores são a polvóra contida na “bala” (ala-B) desta poesia que o autor preferiu chamar de “arma da victória” que dispara esta bala certeira em que a cada estrofe vai abatendo o seu alvo. Daí nasceu este livro embrulhado por crítica social.
A título de exemplo, o poema “barbearia dos cabrões” (queixo barbudos engravatados/ barbearia dos cabrões/ que deixa todo chão careca/ e ao alto mastro hasteiam bandeira/ para desfraldarem o corpo nu do povo…’’)
“Apesar da irrequietude e da impenitência, algumas vezes virulentas que caracterizam esta poesia ou das intermeadas doses de apurada ironia ou de compaixão pelos desafortunados, o que sobressai nesta forma particular da escrita é um virtuosismo estimulador da sensibilidade da razão, (…), nessa brevidade desafiadora da nossa capacidade leitoral e estetica.” (F.NOA-o prefaciador).

Segundo Zenão, a brevidade é um estilo que contém o necessário para manifestar a realidade. Esta brevidade encaixa-se na poesia do A.Nordine na qual se nota uma presenca massiva de traços intertextuais da obra do poeta Celso Manguana, cidadãos da mesma esquina (ambos eram jornalistas culturais do semanário Zambeze), guerreiros da poesia epigramática e soldados da mesma trincheira. O Amin Nordine exilou-se na morte, o Celso Manguana exilou-se na loucura, e eu procurarei exilar-me na memória destes 2 poemas:

“Sonâmbula esta pátria/ cresce nas estatísticas/ e acorda com fome/ custa amar uma bandeira assim?/ tem o amargo do asilo/ almoço de pão com badjias/ sabem bem todos dias.” Celso Manguana pag.14- aos meus pais-Pátria que me pariu-2006.

“Se por tanto tivesse ser capaz/ moça-pátria deste amor que refrega/ seja o meu coração a minha entrega/ escrever-te a cerca duma paz/ e alto levante-se da vez que nega/não é para o povo o discurso assaz/ nenhum político, milagroso ás/ é tamanho o sofrimento que chega!/ para o povo aumentem um quinhão/ venha do vosso governo mais pão/ burilada a página da história/ apagar a sua triste memória/ fazemos o país livre da escória!!!” A.Nordine-pag.50-soneto da paz-Do lado da ala-B-2003.


Heterónimo de Amosse Mucavele-membro do Movimento Literário Kuphaluxa. Visite-nos em kuphaluxa.blogspot.com/revista literatas.

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