TEMPO DE BICHOS - PRIVATE Z(oo)M
Celebrando as 70 vidas do poeta Arménio Vieira
29 de Janeiro 2011 - 18:30 - Livraria CE BUCHHOLZ - Rua Duque de Palmela, 4 - Lisboa
Mais uma performance do TRIO MAJINA
desta vez sobre os BICHOS na poesia de Conde de Silvenius.
Mito Elias - Poesia, vídeos e sonorizações.
Elmano Caleiro - Contrabaixo e Baixo eléctrico.
José Brazão - Percurssão.
José Cunha - MC & orador residente.
TEMPO DE BICHOS – Projecto MAJINA
O POETA
Que bichos são estes, senão nós mesmos. Sempre o homem, na sua condição mortal e precária, com as suas grandezas e misérias, no centro da obra de Arménio Vieira. Mesmo quando convoca os Bichos do seu animalário, ou sobretudo quando os convoca, para se tornarem no espelho de todas as nossas perplexidades, onde buscamos as impossíveis respostas para este improvável destino de bicho-gente que somos. Para o poeta de Mitografias, à força de querermos ser diferentes transformamo-nos em burros, sem que isso nos dê a dignidade que ser burro, jerico ou asno implica. De tão distraídos, e sonolentos, tornamo-nos “animais de capoeira”. Não galinhas, porque como nos lembra o poeta “as coisas
são o que são”. Fazem de nós galináceos adormecidos e anestesiados. Podemos também ser frustrados e vingativos tubarões, ou tigres sanguinários e sem nobreza. Há uma nobreza de bicho que em nós se transformou em mera animalidade, e que fomos perdendo como em HOMENS-CÃES (E VICE VERSA). Mas desenganem-se. Os homens não são bichos. São meros bichos e animais como os bichos e os animais nunca ousam ser. Sim, porque afinal “as coisas são o que são”, e “mais não digo”, diz o poeta, na forma irónica de quase tudo dizer no que diz não dizer. Irónico, mordaz, corrosivo, com um refinado sentido de humor, são estes alguns dos instrumentos de precisão com que Arménio Vieira nos sonda a alma e põe a nu o sentido da existência. Herdeiro de uma tradição literária maior, Homero, Dante, Shakespear, Camões, Melo Neto ou Sena, é toda uma tradição cultural e literária na qual ele se insere e se assume, “li-os todos” (Arménio dixit), que está no centro da sua obra e nela se prolonga sem angústias.
O PROJECTO
Que nome dar a este espaço de exaltação estética, em que somos convocados para a celebração da palavra, numa ritualização mágica e interactiva, que nos franqueia os domínios do sagrado pela porta profana do fascínio, do prazer e da fruição plásticas?
Domina nestas performances o aparato da sua encenação, e não estamos distantes dos rituais da sagração. Mas sem obediência a um qualquer cânone, que não seja o do improviso, da experimentação, da irrupção do novo. Não faltam também, como nos domínios do sagrado, as técnicas, os instrumentos, os objectos, e até a figura do celebrante, embora aqui estejam estiolados, implodidos na sua missão de ordenamento, regulação e controlo, que dão lugar a uma prática da desobediência, da iconoclastia, de inesperado e até de insólito. É uma atmosfera mais mágica que mística, um território mais estético que religioso mas onde não estão totalmente ausentes o espiritual e o sagrado. Os caminhos é que são outros, diversos, inusuais. Enquanto espaço de ritualização ele obedece a um processo de constante reinvenção, recriação. É a isto que chamamos PERFORMANCE POÉTICA, ou POÉTICA PERFORMATIVA, ou ainda ORAL ACTION (à maneira da Action Painting), território complexo e pluridisciplinar de hibridização pós-moderno, onde as linguagens se fundem num processo fecundo de crioulização e mestiçagem.
O AUTOR
Os trabalhos de Mito obrigam-nos constantemente a um olhar outro sobre a realidade. Um pouco à semelhança de uma certa poesia de Arménio Vieira, aqui celebrada, é um exercício de atenção contra a desatenção a que estamos sujeitos (ver poema ISTO É QUE FAZEM DE NÓS). A procura constante de processos de contaminação, de técnicas e de linguagens, sublinha o carácter experimental de um trajecto ímpar no panorama da arte caboverdiana.
José Cunha
http://www.youtube.com/watch?v=rEUDKQ5Rzqk
Um espaço dedicado à literatura negro-brasileira, às literaturas africanas de língua portuguesa e demais literaturas negro-diaspóricas
sábado, 29 de janeiro de 2011
John Bella – Estes dois são cão e gato (livro)
John Bella – Estes dois são cão e gato
Por Ricardo Riso
O escritor angolano John Bella brinda o público infantil com o seu terceiro livro, Estes dois são cão e gato, com ilustrações de Casimiro Pedro e prefácio de Chó do Guri, sob a chancela da União dos Escritores Angolanos no ano de 2010.
John Bella é o heterónimo de Jorge Marques Bela. Ingressou na Brigada Jovem de Literatura de Luanda em 1984. “Água da Vida”, seu primeiro livro de poesia, foi publicado em 1995, seguido de “Panelas cozinharam madrugas” no ano de 2001 e de “Cântico romântico (à Paz), em 2003. Para as crianças, sua estreia literária se deu em 2007 com “As orelhas do coelho Hélio” e no ano seguinte, “A lenda do gato e o rato”.
A cativante narrativa de Bella recorre à cultura da etnia kimbundu e conta a história da criação do mundo por Tata Yetu, ou melhor, Tata Yetu um Dywlu. As páginas transcorrem com graciosidade e a delicadeza do texto conciso e preciso de Bella em plena harmonia com a leveza das ilustrações de Pedro. Assim, retornando aos primórdios da criação e associando-os a objetos e atividades contemporâneas, as crianças aprendem como o mar foi criado, o surgimento do sol, das estrelas e da lua, o crescimento das florestas etc.
A sensibilidade da narrativa de Bella e seu caráter instrutivo aparecem de diversas formas, ora na valorização do trabalho para manter o ambiente em que se vive limpo, ora na boa conduta e delicadeza de se ofertar flores às pessoas, para além de destacar a importância de adquirir o hábito de se comer frutas.
Grande destaque é dado à escola, à pertinência das crianças frequentá-la, de se respeitar a professora e do valor de se respeitar e amar a pátria no ato de cantar o Hino Nacional. Noções de sentimento afável ao país tal como demonstrado na singela composição de Martinho da Vila, Manuel Rui e Rui Mingas, “À volta da fogueira”: “Os meninos à volta da fogueira/ Vão aprender coisas de sonho e de verdade/ Vão perceber como se ganha uma bandeira/ E vão saber o que custou a liberdade”.
Após as lições de bom comportamento das páginas anteriores, a narrativa relaciona como a falta de afinidade entre duas pessoas está ligada ao que Tata Yetu um Dywlu determinou. Cansado de ver a perseguição ininterrupta do gato (Kyangatu, em língua kimbundu) ao rato (Dibengu), resolveu que o cão (mbuwa) passaria a caçar o gato. Dessa maneira, surge a expressão dita quando duas pessoas agem como inimigas: “Estes dois são cão e gato”.
O livro apresenta um formato generoso que favorece a diagramação das páginas, para além das ternas e caprichosas ilustrações de Casimiro Pedro, ainda compõe a publicação um glossário com as traduções das palavras em kimbundu para o português. O texto de John Bella é suave, gracioso e bastante educativo, fazendo de “Estes dois são cão e gato” um excelente presente para os pequeninos.
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Ricardo Riso
António Pompílio – O camaleão e a cobra (livro)
António Pompílio – O camaleão e a cobra
Por Ricardo Riso
Nos últimos anos os expoentes da literatura angolana cumprem um inestimável papel ao dedicarem seus talentos a histórias voltadas para o público infantil. Trata-se de sinal de respeito aos pequeninos e mostram uma postura ousada e sem receio em diversificarem suas produções, por conseguinte, a ampliação de leitores.
Parte ativa desse projeto, a União dos Escritores Angolanos vem contribuindo para a formação de um público-leitor infantil e investindo com generosidade nesse segmento. Em 2009, a celebrada organização lançou “O camaleão e a cobra”, uma pequena narrativa de António Pompílio e ilustrada pelo competente Casimiro Pedro.
O enredo é simples. A história se passa em uma floresta na qual um camaleão cuida de seu casal de filhos. A paz da família é perturbada quando o camaleão escuta os planos malignos da cobra e do macaco. Ambos desejavam devorar a família de répteis. Os camaleões refugiam-se em casa, entretanto, a cobra, desesperada com a fome, pratica uma má ação e rouba a comida da casa do coelho. Quando este descobre que foi assaltado, reclama a todos os animais, porém a dupla sem caráter inventa uma mentira e acusa o camaleão do roubo. Os outros animais revoltam-se com a atitude do inocente camaleão e acabam matando-o.
Contudo, a mentira tem pernas curtas e a verdade logo vem à tona. O leão, o rei da floresta, determina uma severa punição ao macaco e à cobra, enquanto os filhotes do camaleão, agora órfãos, ficarão sob os cuidados de todos os animais da floresta.
A narrativa curta e direta demonstra didaticamente como um roubo seguido de uma mentira pode ter consequências devastadoras para as vidas das pessoas. A bela e trágica metáfora que atinge a família de camaleões proposta por Pompílio, ensina as crianças o quanto é importante a solidariedade nos momentos difíceis e o quanto é ruim e de péssimo comportamento as atitudes da cobra e do macaco. Em seu término, a bela lição de solidariedade que é passada com a dedicação de todos os animais para a criação dos pequeninos camaleões.
Pompílio resgata em sua escrita simples e linear a tradição da narrativa oral angolana, popularmente conhecida como missosso. Através de animais humanizados, a narrativa apresenta por meio de atitudes individuais, códigos de conduta que atingem o coletivo, traçando o seu perfil comunitário.
A publicação tem formato agradável, papel resistente e com boas cores. As ilustrações de Casimiro Pedro, corretas e sem exageros, complementam com maestria o texto de Pompílio. Todavia, algumas gralhas de revisão textual (como as do texto de aba de capa e da página 11) passaram despercebidas e faltou maior cuidado com a relação texto-imagem-cor, dificultando um pouco a leitura (pág. 7). Pequenas falhas que não comprometem a obra, mas que devem ser evitadas, principalmente para o público ainda em formação que se pretende atingir.
António Pompílio. É membro da União dos Escritores Angolanos, natural do Lobito, nascido aos 05-07-1964. Design Gráfico e Jornalista Bacharel do Curso de Língua Portuguesa, na Faculdade de Letras e Ciências Sociais em Luanda. Dentre várias obras, destacamos: “O sal dos Olhos do Mar”, Menção Honrosa, prêmio Sonangol de Literatura de 1994, “Simetrias” e “Mambelé, o engraxador”.
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quinta-feira, 27 de janeiro de 2011
Germano Almeida – Estórias Contadas
Germano Almeida – Estórias Contadas
Por Ricardo Riso
Resenha publicada no semanário cabo-verdiano A Nação, nº 178, de 27 de janeiro de 2011, p. 29.
Detentor de uma consolidada obra em prosa, reconhecido e aclamado nos países de língua portuguesa e no seu país, Cabo Verde, Germano Almeida, natural da ilha de Boavista, possui como principal característica o irreverente humor nos seus textos literários, dentre tantos, destacamos “O testamento do Senhor Napumoceno da Silva Araújo” (1989, adaptado para o cinema), “O meu poeta” (1990), “A família Trago” (1998), “O mar na Lajinha” (2004) e as crônicas reunidas em “Estórias Contadas” (1998), objeto desta resenha.
Trata-se da reunião de cinquenta e cinco crônicas publicadas em jornal, possibilitando ao escritor a oportunidade de ampliar seu público leitor e expor sua ideias. Esse gênero caracteriza-se pela apreensão do cotidiano e encontra na verve irônica de Almeida um agradável espaço para relatar fatos comuns e memórias da infância, versar sobre a poesia do cotidiano, o que aproxima a narrativa da sua crônica ao conto curto como acontece na hilariante disputa do narrador com a sogra em “A minha cadeira”: “E assim ficamos com um único pomo de discórdia: a minha cadeira. Ela chega e é como se durante anos tivesse estado a sonhar-se nela enroscada, porque dirige-se directamente a ela e instala-se com um suspiro de proprietária saudosa, nunca se comovendo a partir desse momento com nenhum dos meus ares infelizes” (p. 89).
Rememorar as abruptas mudanças de seu tempo, a conscientização da crueldade imposta pelo colonialismo, refletir a identidade cabo-verdiana são alguns temas abordados em “Uma forma de identidade africana”. Nessa, o narrador recorda os seus estudos orientados para que se mantenha subserviente e exalte a ex-colônia, noções configuradas nos slogans “mais fácil é obedecer que mandar” e “Aqui é Portugal”. Perante essas passagens, deve-se recuperar o que Roland Barthes, em “Aula”, assinalou como o fascismo da língua, “pois o fascismo não é impedir de dizer, é obrigar a dizer”. A seguir, o narrador comenta a disseminação da ideia de “pertença africana” nos “anos 60-70, com a agitada revelação de que Cabo Verde também era África” (p. 15), “um grande sentimento de esvaziamento” causado pela contestação do que distinguia o ilhéu de outros povos. Contudo, o narrador expõe alternativas que demonstram a condição especial de Cabo Verde ao recorrer ao famoso poema de Ovídio Martins, “Flagelados do Vento Leste”, e na afirmação de Baltasar Lopes da Silva, na qual “não éramos nem africanos nem europeus”; conclui o narrador “que criar essa terceira possibilidade é bem do cabo-verdiano (...) E tivemos que aprender que há tantas identidades culturais quantos os povos africanos, e bem perfeitamente que poderíamos pertencer à África desde que levássemos uma etiqueta a assinalar-nos como senhores de uma identidade que nos particulariza como cabo-verdianos” (p. 17).
A condição de marginalidade imposta pela sociedade contemporânea ao escritor enquanto intelectual é bem aproveitada por Germano Almeida nas crônicas. Edward Said, em “Representações do Intelectual”, salienta que o “intelectual no exílio é necessariamente irônico, cético e até mesmo engraçado, mas não cínico”. Em “A saúde de todos no ano 2000”, Almeida revela o seu descrédito frente às propagandas políticas: “Saúde para todos no ano 2000”; “Educação para todos no ano 2000”; e complementa que “de imediato não quisemos acreditar em tal maravilha, sobretudo porque tinha duas características que logo nos fizeram desconfiar da sua seriedade: era de graça e era para todos” (p. 33).
Germano Almeida relata em “Estórias Contadas” passagens do passado colonial na sua infância, situações pitorescas imediatas ao pós-independência e casos recentes da década de 1990. De impostores a presidiários, do apreço ao vinho ao amor ao futebol, essas agradáveis crônicas exaltam o país, o ilhéu e sua cultura: “assim é o cabo-verdiano: orgulhoso da terra onde vive, sofre e labuta contra a permanente estiagem, os olhos no estrangeiro, o coração nas ilhas” (p. 12).
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terça-feira, 25 de janeiro de 2011
Crítica ao ostracismo do negro na literatura, a Lei 10.639/2003, o afro-brasileiro e a África
Crítica ao ostracismo do negro na literatura, a Lei 10.639/2003, o afro-brasileiro e a África
Lamentável! Foi o meu sentimento após a leitura da matéria “Negro: imagem e semelhança de quem” de Sônia Marta Coelho Pereira, inserida no caderno especial “A trajetória dos personagens negros, da África ao Brasil” da revista Conhecimento Prático: Literatura, nº 34 – janeiro/2011, páginas 27 a 38. É triste constatar que uma das raras revistas dedicadas à Literatura no mercado editorial brasileiro exclui a participação dos escritores negros no corpus literário nacional, orientação claramente seguida pela autora do artigo supracitado e que me remete ao que Roland Barthes definiu como “fascimo da língua”, pois a língua está “a serviço de um poder”. No caso, o poder da discriminação racial aos negros que norteia o pensamento brasileiro.
A proposta do artigo é demonstrar a discriminação que sofreram – e ainda sofrem – os personagens negros da literatura brasileira e como esse processo tem sido revisto na contemporaneidade. As personagens esteriotipadas, apresentando-se nos textos literários em posições sulbaternas, coisificadas, animalizadas e ridicularizadas por causa do fenótipo foi uma constante em nossa literatura e reforçaram o preconceito racial que perdura em nossa sociedade.
A autora até inicia o artigo reconhecendo “que por séculos o negro foi literariamente representado sob a ótica do preconceito”, contudo, o grave erro de sua explanação é não mencionar em nenhum momento autores(as) negros(as), recordando que a crítica brasileira mantinha absoluto silêncio a respeito do preconceito do negro na literatura como bem assinala o escritor e ensaísta, Cuti, em O leitor e o texto afro-brasileiro:
foi preciso que os brasilianistas aqui viessem para desvendar o como se dava a tematização do negro brasileiro. Os intelectuais brancos do País sempre se mostraram avessos a esse empenho. Os primeiros livros que surgiram, questionando e fazendo levantamento de obras para o estudo da questão racial no âmbito literário, foram: A Poesia Afro-Brasileira, de Roger Bastide (1943); O Negro na Literatura Brasileira, de Raymond S. Sayers (1956-58) e O Negro na Ficção Brasileira, de Gregory Rabassa (1965).
Sendo assim, após escancarada a postura do cânone literário brasileiro pela crítica estrangeira, a crítica nacional continua ignorando o fato de que temos escritores negros, relegando-os ao completo ostracismo nos grandes – e são tão poucos – meios literários do país. Essa postura é acompanhada pela autora do artigo aqui referenciado, pois recorre ao incompreensível erro de somente apresentar os personagens negros apropriados e interpretados por quem não é negro e que não oferece a esse personagem o papel de protagonista de suas narrativas nem expõe as vivências comuns a nós, negros.
Seria de imensa valia que a autora fizesse um contraponto com a visão de um personagem negro sendo escrito por um autor negro, tornando, assim, o negro protagonista de sua história, revelando seus anseios, desejos, medos e principalmente expondo o seu ponto de vista frente ao racismo diário que todos nós sofremos neste país. É fundamental a leitura por esse viés como esclarece a Profa. Dra. Maria Nazareth Soares Fonseca em seu artigo Poesia afro-brasileira – vertentes e feições:
A proposta de transgressão, que se efetiva também em textos da chamada literatura afro-brasileira, não pretende iluminar os lugares já indicados pela própria sociedade. Procura ultrapassar mesmo algumas posturas que, embora mais críticas, ainda se ligam a visão do negro “tutelado”, pois, ao falar por ele, silenciam a sua voz e imobilizam reações concretas para desarticular os papéis estabelecidos pela sociedade. (Fonseca, 2000, p.95)
Durante a matéria aqui referenciada, a Profa. Coelho Pereira aponta a mudança de paradigma que se dá a partir de 1980, período em que os títulos “Os tambores de São Luís”, de Josué Montello, e “Viva o povo brasileiro”, de João Ubaldo Ribeiro, como livros que procuraram “resgatar a imagem do personagem negro”. Talvez por desconhecimento, o artigo da autora ganharia em riqueza se revelasse e discutisse os diversos títulos lançados por escritores negros, principalmente a partir do final dos anos 1970 com a publicação das antologias “Cadernos Negros”, do coletivo Quilombhoje, que lança, desde 1978, anualmente e de forma ininterrupta uma coletânea de poesia e no ano seguinte, contos, somente de autores negros. Grandes nomes foram ali publicados e consagrados, tais como Cuti, Oliveira Silveira, Éle Semog, Miriam Alves, Lia Vieira, Lande Onawale, Conceição Evaristo, entre outros.
Conceição Evaristo talvez seja o caso mais surpreendente e inexplicável caso desse ostracismo, já com vários prêmios literários e traduções em diversas línguas de seus poemas, contos e romances. Seus poemas demonstram o cotidiano da mulher negra, a consciência de sua condição em nosso país como muito bem assinala Eduardo de Assis Duarte, eles
enfatizam a necessidade do eu poético de falar por si e pelos seus. Esse sujeito de enunciação, ao mesmo tempo individual e coletivo, caracteriza não apenas os escritos de Conceição Evaristo, mas da grande maioria dos autores afro-brasileiros, voltados para a construção de uma imagem do povo negro infensa dos estereótipos e empenhada em não deixar esquecer o passado de sofrimentos, mas, igualmente de resistência à opressão.
É essa escrevivência, termo cunhado pela própria autora, que sempre foi excluída do cânone literário nacional, escrevivência típica de um eu enunciador negro que aparece nos textos literários dos escritores(as) negros(as), por isso a importância que uma publicação como a Conhecimento Prático: Literatura possua a sensibilidade e ofereça o seu prestigiado espaço para esses(as) autores(as), até então ignorados do cenário nacional e dessa maneira contribuir, de forma positiva e inclusiva, para a inserção do negro em nossa sociedade.
A Lei 10.639/2003, o afro-brasileiro e a África
Um outro ponto da matéria da Profa. Coelho Pereira que gostaria de abordar é no que diz respeito à implementação da Lei 10.639/2003 nas escolas. Preocupa-me abordagens excludentes das manifestações culturais afro-brasileiras. A lei, uma conquista histórica e que contou com a participação efetiva de vários movimentos negros organizados ao longo de décadas de militância, afirma que “torna-se obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira”, assim como incluir “o estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil”. Entretanto, venho percebendo a sutileza perversa do racismo à brasileira no contato com alguns professores, por conseguinte a má vontade das escolas em implementar a Lei. As justificativas são diversas, tais como a de que não há racismo no Brasil e isso seria uma forma de acirrar as diferenças étnicas – como se o(a) estudante negro(a) não fosse discriminado de maneira ostensiva e cotidiana no espaço escolar – e também o preconceito manifestado em relação às religiosidades afro-brasileiras.
Bom, se uma Lei é criada para dar visibilidade à cultura afro-brasileira, por que ainda assim os escritores(as) negros(as) são excluídos das escolas e de uma matéria em uma revista especializada em Literatura como a Conhecimento Prático? A Profa. Coelho Pereira afirma que “apesar de essa lei não ter saído do papel em muitas escolas brasileiras, ela é uma grande conquista”, por que “a literatura negra começa a ganhar espaço nas escolas”. Mas para qual literatura negra aponta a autora, quais são seus agentes se no artigo de sua autoria nenhum escritor negro é apresentado? Esse é ponto crucial: a invisibilidade dos(as) escritores(as) negros(as). Por causa dessa incompreensível ausência, escorando-me em seu artigo e tratando-se do segmento infanto-juvenil, friso que não tenho nada contra a obra de Rogério Andrade Barbosa, aliás, aprecio bastante, porém faço questão de citar alguns bons livros e seus autores – todos negros – publicados, a maioria recentemente, que seguem as diretrizes da lei 10.639/2003: “A cor da ternura” de Geny Guimarães, “Betina” de Nilma Lino Rodrigues, “Os ibejis e o carnaval” de Helena Theodoro, “Kofi e o menino de fogo” de Nei Lopes, “Omo-obá: histórias de princesas” de Kiussam Oliveira e “Os nove pentes da África” de Cidinha da Silva. Para não ficar exaustiva, encerro a lista apenas para demonstrar que temos escritores(as) negros(as) lançando ótimos títulos nesse segmento.
Faço uma consideração próxima aos autores africanos. Há na matéria “Negro: imagem e semelhança de quem”, pequenas seções nas laterais das páginas. Em uma delas, com o sugestivo título “Curioso”, lê-se o seguinte: “Muitos ficam espantados quando se deparam pela primeira vez com uma fotografia de Mia Couto: embora seja um dos mais proeminentes escritores africanos dos nossos dias, ele é branco” (p. 34). Pois é, o cânone das literaturas africanas de língua portuguesa é praticamente formado por escritores brancos.
Entretanto, quando se olha atentamente para o mercado editorial brasileiro, constata-se que os livros publicados desse segmento são próximos daqueles publicados em Portugal, ou seja, segue-se a política racista dos portugueses em publicar escritores brancos, quando muito, mestiços. Mia Couto, apesar da exaustiva redundância de seus últimos romances, é um excelente escritor como no livro citado na matéria, “Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra”, em “Terra sonâmbula”, e nos contos de “Estórias Abensonhadas” e “Vozes anoitecidas”. Sem motivo aparente, as editoras brasileiras ignoram autores, dentre tantos outros, como os angolanos João Maimona e João Tala; os novíssimos moçambicanos Sangare Okapi e Andes Chivangue; e o cabo-verdiano José Luis Hopffer Almada. Apenas para citar excelentes nomes consagrados, respeitados e premiados da produção contemporânea nos seus países. Sendo assim, bastaria um olhar sensível às obras desses e de outros autores por parte de nossos editores para que em uma apresentação de escritores africanos em sala de aula, a cor da pele não causasse espanto aos alunos. Quem é professor e que já mostrou fotos de autores africanos compreende o que estou falando.
Para finalizar, a contundência de minhas observações é motivada por uma postura sincera, posso dizer indignada, diante de um artigo que se demonstra equivocado em seu conteúdo, e que, por isso, almeja o respeito que nossos escritores negros merecem no meio literário brasileiro. Não poderia ter uma posição de indiferença pelo que li, ainda assim continuarei torcendo para que uma revista respeitável como a Conhecimento Prático: Literatura atente-se para os agentes da literatura afro-brasileira e contribua para retirá-los da invisibilidade que lhes é imposta.
Sem mais,
Ricardo Riso
Pesquisador de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa
i CUTI. O leitor e o texto afro-brasileiro. In: < http://www.cuti.com.br/ > Acessado em 24 de janeiro de 2011.
ii FONSECA, Maria Nazareth Soares. Poesia afro-brasileira – vertentes e feições. In: SOUZA, Florentina Souza, LIMA, Maria Nazaré (orgs.). Literatura afro-brasileira. Fundação Palmares e Centro de Estudos Afro-orientais (CEAO), 2006.
iii DUARTE, Eduardo de Assis. “O BILDONGSROMAN afro-brasileiro de Conceição Evaristo.” ALEXANDRE, Marco Antônio (Org.). Representações performáticas brasileiras: teorias, práticas e suas interfaces. Belo Horizonte: Mazza Edições, 2007.
sexta-feira, 21 de janeiro de 2011
José Luis Hopffer Almada: o poeta-intelectual e o tempo em que vive
O poeta-intelectual e o tempo em que vive
por Ricardo Riso
Resenha publicada na seção Artes & Cultura do semanário cabo-verdiano A Nação, nº 176, de 13 a 19/01/2011, p. 29
O dilaceramento da sociedade mascarado pela ordem neoliberal vigente transforma o cotidiano em um simulacro cínico e hipócrita de bem-estar, anula o senso crítico e anestesia os sentidos das pessoas, tornando-as inertes frente às contradições da pós-modernidade. Caberia aos poetas, enquanto intelectuais e perscrutadores do seu tempo, manifestar o descontentamento diante da aparente inevitabilidade de mudança, de desolação pelo passado e de melancolia pelo futuro que se anuncia? A leitura de “Praianas – Revisitações do Tempo e da Cidade” (Praia: Spleen Edições, 2009), de José Luis Hopffer Almada, auxilia-nos a tecer breves considerações acerca do papel do poeta-intelectual e o tempo em que vive.
“Em defesa dos intelectuais”, Jean-Paul Sartre afirma que “o intelectual é alguém que se mete no que não é da sua conta”, estimulando a sociedade burguesa a afastá-lo, pois suas observações são incômodas e provocativas, tornando-se conveniente desacreditá-lo e legá-lo ao ostracismo. Edward Said no capítulo “Exílio intelectual: expatriados e marginais”, do livro “Representações do Intelectual”, segue as ideias propostas por Sartre e mostra que os intelectuais são conduzidos a conviver à margem da sociedade, pois o exílio “é o desassossego, o movimento, a condição de estar sempre irrequieto e causar inquietação nos outros”, por que se afastando “das autoridades centralizadoras em direção às margens, onde se podem ver coisas que normalmente estão perdidas em mentes que nunca viajaram para além do convencional e do confortável”.
Sendo assim, consideramos que o nome literário Erasmo Cabral de Almada, a faceta corrosiva e voraz de Hopffer Almada, apresenta-se como aquele que importuna a ordem estabelecida e ciente de sua condição: “Eis-me/ entre os papéis/ e estes me dizem:/ é arriscado/ ser-se indagador”. Há o descrédito com o futuro na imagem da criança no lixo, contrapondo-se aos ideais cabralinos de que “as crianças são as flores da revolução/ a razão principal da nossa luta”, tratado de forma crepuscular diante da perpetuação da miséria: “Em aziaga aparência/ debruça-se uma criança/ sobre o contentor de lixo/ e no seu fundo/ surge-lhe/ como o impacto da revelação/ (...) o longo precipício do destino/ o irresistível declínio dos dias...”.
Os poemas atribuídos a Erasmo Cabral de Almada caracterizam-se por um atento olhar das metamorfoses sofridas no Cabo Verde independente. Por isso, temos o desencanto diante das incongruências da política – “com os meus antigos ideais/ perdidos” – expressado por “txibita” (arquétipo do ilhéu): “txibita deixou/ de respirar as palavras dos outros/ (...) por isso/ txibita (...)/ é apátrida/ na sua pátria c.v.”. A indignação do poeta-intelectual com o ocaso dos ideais revolucionários desintegrados com o passar dos anos, demonstra-se no desalento de quem foi partícipe daquele momento histórico: “Também eu/ polícias, vigiei/ vertical/ entre as implacáveis palavras de um ideal/ as verdes folhas de uma promessa/ as reconfortantes falácias de uma utopia/ temendo que/(...) depois somente restassem/ trucidadas sombras da história/ soçobradas recordações do destino”.
Um olhar cáustico e impiedoso sobre a sociedade cabo-verdiana é apresentado em “Cidade VI”, porém um olhar consternado frente às mudanças dilaceradoras da Praia. Novamente, os dirigentes políticos o alvo dileto dos “sobreviventes da cidade” que “cogitam demoradamente na obstinação desses antigos combatentes do mato agora reciclados como sagazes salvadores da pátria”.
Contra a hipocrisia do século XXI, inferimos que o discurso à margem proposto pelo poeta José Luis Hopffer Almada contribui para revelar verdades incômodas à ordem estabelecida em seu país, fazendo da poesia espaço de consciência crítica. Por mais dilacerada que esteja essa consciência, em seu exílio ela sobrevive “de novo/ com os meus ideais”, ainda que desacreditados do PAIGC, porém iluminados pela estrela negra desse intelectual “caçador de estrelas”.
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quinta-feira, 20 de janeiro de 2011
Tchalé Figueira - Água Cristalina (blog literário)
Tchalé Figueira, o artista plástica e escritor cabo-verdiano, inicia o ano de 2011 com um novo blog, este dedicado à literatura: o Água Cristalina. O antecessor, Arco da Velha, continua firme na divulgação das obras e do pensamento político do artista.
Abraços,
Ricardo Riso
Abraços,
Ricardo Riso
TCHALÉ FIGUEIRA ‘DO ARCO DA VELHA’ (exposição Lisboa/Portugal)
TCHALÉ FIGUEIRA‘DO ARCO DA VELHA’
26 Fevereiro > 09 Abril 2011
Qua > Sáb 14 h > 19 h
PINTURA INSTALAÇÃO POESIA DO ARCO DA VELHA
O imaginário é, sim, o que existe. O real, se me permitem, é algo puramente inconsequente, algo que não se traduz, algo impossível de concretizar. Conhecemos as geografias e os corpos em nosso redor através da imaginação que cultivamos. Quando a imaginação e o desejo são escassos, os amores e vontades dos outros tornam-se loucuras.
Invariavelmente, nós aqui, neste lugar, somos construídos segundo relações flexíveis entre a miséria e o desejo. O desejo consome e exige a urgência da materialização do faz-de-conta. No Carnaval, tal como no plano multi-dimensional da imaginação, a Rainha e o Rei colocados no cimo do andor desenhado pelo artista, que esta terra quer sempre ter como anónimo, são escravos dos nossos desejos de chegar mais além, de cada vez ser mais outro e o Outro. Esconde-se o feio que engloba gente. Gente que, apesar de ser parte de nós é, inexplicavelmente, considerada diferente.
A irreverência é naturalmente constitutiva da arte que faz perguntas, a arte que exibe o diferente enquanto nosso, a arte que se quer posicionar dentro do campo do político e por isso é Pecadora. O questionar obviamente não desmembra o autocratismo, mas revela desejos de mudança. No caso particular do pintor, revela principalmente a vontade de mudança para estados de sensibilidade e empatia no âmbito de um contexto abrangente em que o Homem, Deus e a Verdade foram declarados mortos no mundo real e que somente vivem no campo do exercício dos poderes. Apenas nos restam as vontades individuais de imaginar os desejos dos outros como nossos.
Desde a Rua da Praia, no Mindelo, num atelier com as portas abertas para o mar, Tchalé Figueira, sempre independente e certo das suas vontades e procuras, compreende o compromisso de ser “agente criativo”, aqui neste lugar insular. O articular de perguntas e desejos em prol de si próprio mas também em prol dos que o sistema define como o “Outro menor”, os que o sistema teimosamente “circum-navega” porque, em hora de eleições, um grogue ou uma T-shirt servem como suficiente sedução.
Tchalé explora a relação entre o acto e a crítica social. Tristan Tzara, Max Weber ou Jean Dubuffet sublinharam algumas directrizes que permitem compreender a posição do pintor: consciente, sensível e critico e, no entanto, determinado na perseguição do exercício da pergunta. Na obra de Tchalé Figueira, o político, a prostituta, o mendigo, o paupérrimo, o medo, a vergonha, a vaidade, a superficialidade, a tensão ou o desejo estão presentes, vivos e pulsantes. As telas gritam-nos perguntas acerca do nosso próprio papel.
Irineu Rocha
Tchalé Figueira nasceu em 1953 na ilha de S. Vicente, Cabo Verde. Pintor, músico e poeta, Tchalé é hoje em dia, indiscutivelmente, um dos ícones principais da Arte Contemporânea em Cabo Verde e seguramente o artista plástico caboverdiano com maior visibilidade internacional. ‘Do Arco da Velha’, é a sua primeira exposição individual na INFLUX CONTEMPORARY ART.
Irineu Rocha nasceu em Santo Antão, Cabo Verde. É licenciado em Belas Artes pela Willem de Kooning Academy, Roterdão e Mestrando em Belas Artes pela Central St. Martins School of Art and Design, Londres. Entre 2002 e 2009 exerceu varias funções em projectos de educação e de arte contemporânea no sector dos museus e galerias publicas em Londres, com especialização progressiva na área de gestão de projectos. Entre 2006 e 2008 foi assistente de curadoria para o New Visions of The Sea, programa internacional de arte contemporânea do National Maritime Museum de Londres. Desde 2009 é director do M_EIA, a primeira instituição de ensino superior dedicada às Artes Visuais e Design em Cabo Verde.
INFLUX CONTEMPORARY ART
Rua Fernando Vaz, 20 B1750-108 Lisboa
+ 351 91 850 1234
Abraão Vicente - Bú ê (exposição - Lisboa/Portugal)
Bú ê
Nota de imprensa
Assunto: Exposição de pintura de Abraão Vicente
A Galeria Bozart vem por este meio divulgar a abertura da exposição de artes plásticas do artista Abraão Vicente. “Bú ê”, como título é ao mesmo tempo uma alusão ao neologismo que significa “muito” e à uma tradução literal do crioulo para o Português do Tu és. É um questionamento.
A vernissage de abertura é no dia 18 de Dezembro às 18h da tarde na Galeria Bozart, em Lisboa. (Ver o convite em anexo)
A exposição inclui três painéis distintos (ver anexo) à base de técnica mista, pintura, desenhos e colagem:
1- “Living room with everybody looking at the same thing and thinking the same thing at the same time”
3- “Some people never go crazy or else movement of pieces eating one another”
Os painéis reflectem temas e considerações recorrentes no trabalho de Abraão Vicente, como sendo, um forte questionamento identitário, a cidade e o tempo, a constância e a repetição. A cidade que por sua vez não é constante mas um corpo em mutação. O tempo por consequência múltiplo e repetitivo. Nos signos, nos símbolos, nos suportes, nas histórias/estórias, na cidade como tela, suporte e como matéria-prima (ver série “Some people never go crazy or else movement of pieces eating one another”)No painel “Hard things in a very simple way” é evidente uma revisitação à própria história de arte, com a presença de figuras centrais de algumas das mais conhecidas fotografias de Man Ray. Por sua vez essas imagens só e apenas ganham sentido na composição do quadro quando lidas à luz das palavras de Samuel Beckett.
Em “Living room with everybody looking at the same thing and thinking the same thing at the same time”, ao par de um estudo de formas e composição pela apropriação de uma escultura em barro das mulheres de “Trás di monte”, também há uma referência muito evidente à fotografia de Helena Almeida através das manchas negras que acabam por ser “sombras” dos mais conhecidos ensaios da fotógrafa portuguesa.
Também evidente é a presença da literatura através dos próprios títulos das séries, que são tributos a nomes como Charles Bukowski, Jack Kerouac e ao artista Marcel Duchamp.
A exposição estará patente de 18 Dezembro 2010 até 19 de Fevereiro de 2011.
Receba as nossas melhores saudações.
GALERIA BOZART
Rua da escola Politécnica, 4 R/C, 1200-457, Lisboa – Portugal
Opening hours:
Tue-Fri 2 pm – 6 pm
Sat 10 am – 2 pm
Fonte: e-mail gentilmente enviado por Abraão Vicente em 14/12/2010.
Mito Elias e Ana Rita Pires - DE PAREIDOLIA - PAREDIS & NUMBRASOM
DE PAREIDOLIA - PAREDIS & NUMBRASOM
MITO ELIAS & ANA RITA PIRES
21 Janeiro / 19 Fevereiro 2011
Casa das Artes e da Cultura do Tejo - Vila Velha de Rodão
Mais 1 caminhada DE PAREIDOLIA desta vez exalando o subtítulo - PAREDIS & NUMBRASOM. Na verdade a aldeia da Serrasqueira no Concelho de Vila Velha de Rodão despertou em nós essa intensa aventura visual e sonora que foi ganhando outras formas e novos conteúdos na cidade da Praia, onde celebramos há 1 ano, a 1ª parte desta odisseia. Contamos rumar outras rotas pós PAREDIS & NUMBRASOM, pois PAREIDOLIA irá prosseguir sua veia itinerante buscando sempre outras maturações.
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sexta-feira, 7 de janeiro de 2011
Rui Knopfli - Antologia Poética (livro - Ed. UFMG)
Rui Knopfli - Antologia Poética
Eugénio Lisboa - Organizador
Área: Letras
Poesia
Coleção: Poetas de Moçambique
2010. 206 p. ISBN: 978-85-7041-715-2
Antologia poética de Rui Knopfli (1932-1997), poeta moçambicano que produziu uma encorpada e original obra literária durante o período de formação de seu país. Os poemas selecionados estabelecem diálogo com as principais tradições clássicas e modernas da poesia. Posfácio com texto crítico e nota biobliográfica de Roberto Said.
Fonte: Editora UFMG
José Craveirinha - Antologia Poética (livro - Ed. UFMG)
José Craveirinha - Antologia Poética
Ana Mafalda Leite - Organizadora
Área: Letras
Poesia
Coleção: Poetas de Moçambique
2010. 198 p. ISBN: 978-85-7041-849-4
Um dos nomes cruciais da literatura moçambicana, José Craveirinha apresenta um obra concisa, que cobre cinco livros publicados em vida e duas coletâneas póstumas, além de dezenas de poemas espalhados em periódicos e antologia. Este livro reúne os principais poemas do autor com nota biobliográfica de Emílio Maciel.
Fonte: Editora UFMG
Vozes de Moçambique - um paralelo com o Brasil (Documentário)
Estreia do documentário Vozes de Moçambique - um paralelo com o Brasil (17'), direção de Yana Campos, dia 14 de janeiro, às 19h, no Cineclube Atlântico Negro, à rua Sorocaba, 190 - Botafogo - Rio de Janeiro. Em seguida será exibido o documentário moçambicano Timbila mabimba chope (52'), do cineasta Aldino Languana.
quarta-feira, 5 de janeiro de 2011
Malangatana Valente: 06/06/1936 - 05/01/2011
O meu apreço pelas literaturas africanas de língua portuguesa sempre acompanha a admiração pelos artistas plásticos desses países. É assim com os amigos cabo-verdianos Tchalé Figueira, Mito Elias e Abraão Vicente; com os angolanos Yonamine e Kiluanje Kia Henda, Antonio Ole, Van e Jorge Gumbe; de Moçambique, com Naguib Abdula e com Malangantana Ngwenia Valente. Sendo que este agora pinta seus all-over pollockianos de rostos retorcidos à exaustão em outras margens. Malangatana faleceu nesta madrugada, na cidade de Matosinhos, Portugal.
Portanto, aqui presto minha homenagem àquele que tanto me emocionou e emociona cada vez que folheio os livros que tenho sobre sua obra, do encantamento causado a cada apresentação que faço de sua arte, a este, como disse Mia Couto, “‘ingênuo’ invocador do caos, sábio perturbador das nossas certezas”, encerro, dizendo apenas meu muito obrigado e que descanse em paz.
A seguir o primeiro texto que fiz sobre a obra de Malangantana Valente, para ler a versão completa clique aqui.
Ricardo Riso
Estar-se no sítio como moçambicano, como africano, e fazer com que as pessoas conheçam mais um pouco Moçambique:
Malangatana Ngwenya Valente
Para o meu primeiro texto sobre Moçambique não poderia ter deixado de escolher o pintor da Matalana, Malagantana Ngwenya Valente. Nascido em 1936 numa região de etnia ronga, sendo que o apelido Ngwenya, significa jacaré, venha da África do Sul, de seu pai, que era de etnia zulu, Malangatana talvez seja hoje o maior pintor da história moçambicana.
A obra deste artista apresenta-nos e obriga-nos a mergulhar entre seres mitológicos assustadores e homens, ora híbridos, perdidos, comprimidos no espaço asfixiante da superfície pintada a revelar-nos a irracionalidade do colonialismo, a desumanidade das guerras colonial e da desestabilização em cores contrastantes e impactantes. Renascem figuras metamórficas, monstros que permeiam o imaginário do moçambicano, violentado com tantos anos de guerra. Mia Couto assinala:
“Estes rostos repetidos até a exaustão do espaço, estas figuras retorcidas por infinita amargura são imagens deste mundo criado por nós e, afinal, contra nós. Monstros que julgávamos há muito extintos dentro de nós são ressuscitados no pincel de Malangatana.
Ressurge um temor que nos atemoriza porque é o nosso velho medo desadormecido. Ficamos assim à mercê destas visões, somos assaltados pela fragilidade da nossa representação visual do universo. (...)
No seu traço está nua e tangível a geografia do tempo africano. No jogo das cores está, sedutor e cruel, o feitiço, (...)
Estes bichos e homens, atirados para um espaço tornado exíguo pelo acumular de elementos gráficos, procuram em nós uma saída. A tensão criada na tela não permite que fiquem confinados a ela, obriga-nos a procurar uma ordem exterior ao quadro. Aqui reside afinal o gênio apurado deste ‘ingênuo’ invocador do caos, sábio perturbador das nossas certezas.”
Portanto, aqui presto minha homenagem àquele que tanto me emocionou e emociona cada vez que folheio os livros que tenho sobre sua obra, do encantamento causado a cada apresentação que faço de sua arte, a este, como disse Mia Couto, “‘ingênuo’ invocador do caos, sábio perturbador das nossas certezas”, encerro, dizendo apenas meu muito obrigado e que descanse em paz.
A seguir o primeiro texto que fiz sobre a obra de Malangantana Valente, para ler a versão completa clique aqui.
Ricardo Riso
Estar-se no sítio como moçambicano, como africano, e fazer com que as pessoas conheçam mais um pouco Moçambique:
Malangatana Ngwenya Valente
Para o meu primeiro texto sobre Moçambique não poderia ter deixado de escolher o pintor da Matalana, Malagantana Ngwenya Valente. Nascido em 1936 numa região de etnia ronga, sendo que o apelido Ngwenya, significa jacaré, venha da África do Sul, de seu pai, que era de etnia zulu, Malangatana talvez seja hoje o maior pintor da história moçambicana.
A obra deste artista apresenta-nos e obriga-nos a mergulhar entre seres mitológicos assustadores e homens, ora híbridos, perdidos, comprimidos no espaço asfixiante da superfície pintada a revelar-nos a irracionalidade do colonialismo, a desumanidade das guerras colonial e da desestabilização em cores contrastantes e impactantes. Renascem figuras metamórficas, monstros que permeiam o imaginário do moçambicano, violentado com tantos anos de guerra. Mia Couto assinala:
“Estes rostos repetidos até a exaustão do espaço, estas figuras retorcidas por infinita amargura são imagens deste mundo criado por nós e, afinal, contra nós. Monstros que julgávamos há muito extintos dentro de nós são ressuscitados no pincel de Malangatana.
Ressurge um temor que nos atemoriza porque é o nosso velho medo desadormecido. Ficamos assim à mercê destas visões, somos assaltados pela fragilidade da nossa representação visual do universo. (...)
No seu traço está nua e tangível a geografia do tempo africano. No jogo das cores está, sedutor e cruel, o feitiço, (...)
Estes bichos e homens, atirados para um espaço tornado exíguo pelo acumular de elementos gráficos, procuram em nós uma saída. A tensão criada na tela não permite que fiquem confinados a ela, obriga-nos a procurar uma ordem exterior ao quadro. Aqui reside afinal o gênio apurado deste ‘ingênuo’ invocador do caos, sábio perturbador das nossas certezas.”
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