quinta-feira, 31 de julho de 2008

Ondjaki - Bom dia camaradas (excerto)

Ondjaki já é há algum tempo um nome consolidado da nova literatura angolana. Seus textos em poesia, romances e contos geralmente enveredam pelos caminhos intermináveis e férteis da memória. Ao recorrer às lembranças da tenra idade, conduz-nos a uma escrita sensível, comovente e sonhadora, entretanto, isto não quer dizer que seja passível aos problemas sociais e políticos de seu país estimulados pelo fim das utopias e engolidos pela ganância inescrupulosa do capital estrangeiro, com a conivência de uma elite submissa e corrupta.

Neste pequeno excerto de Bom dia camaradas, deparamo-nos com o lirismo característico das suas narrativas. O retorno às recordações da infância é tecido com leveza e simplicidade nas observações da criança. Encontramos a presença da oralidade subvertendo a sintaxe da língua portuguesa (influência de Luandino Vieira); uso corrente de termos de um governo de vertente socialista; as condições miseráveis que boa parte da população era obrigada a viver, demonstrando que as promessas da revolução para a construção de um novo país não foram cumpridas; a escola no cotidiano dos então pioneiros; e a presença do elemental água, representado pela chuva. Chuva e sonho... Chuva como elemento fecundador da terra a germinar uma nova vida, um novo país. A evasão do artista ao tentar visualizar uma outra realidade diante do caos, das incertezas e frustrações do cotidiano angolano dos anos 1980.

Ricardo Riso

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Depois do almoço fui deitar-me naquela cadeira verde, comprida, lá no quintal. Estava a ventar um bocado, o que era bom, porque assim eu podia adormecer rápido, com o barulho das folhas do abacateiro a chocalharem.

Nos dias em que o céu não estava tão escuro, eu gostava de imitar as lesmas do meu jardim, e deitar-me ali mesmo ao sol. Lá na cozinha, o camarada António fazia barulho com os pratos e com os copos, ele sempre demorava muito tempo a lavar a loiça. Esse barulho é que acostumava me adormecer. “Menino, acorda então... Faz mal ficar com a cabeça ao sol... Depois a mãe vai ralhar com o menino...”, ele gostava de dizer. “Mas já passou quanto tempo, António?... Ainda nem adormeci um bocadinho...”, eu queria refilar. “Ê menino!, passou mais de vinte minuto...”

Acordei com os pingos da chuva a me bombardearem as pernas e as bochechas. De repente, começou a cair uma carga d’água daquelas valentes. Fui pra baixo do telheiro e fiquei a ver a água cair. Lembrei-me imediatamente do Murtala: na casa dele, quando chove, só podem dormir sete de cada vez, os outros cinco esperam todos encostados na parede onde há um tectozinho que lhes protege. Depois é a vez dos outros dormirem, assim mesmo, juro, sete de cada vez. Sempre que chove de noite, o Murtala, no dia seguinte, dorme nos três primeiros tempos.

Ao ver aquela tanta água, lembrei-me das redacções que fazíamos sobre a chuva, o solo, a importância da água. Uma camarada professora que tinha a mania que era poeta dizia que a água é que traz todo aquele cheiro que a terra cheira depois de chover, a água é que faz crescer novas coisas na terra, embora também alimente as raízes dela, a água faz “eclodir um novo ciclo”, enfim, ela queria dizer que a água faz o chão dar folhas novas. Então pensei: “Epá... E se chovesse aqui em Angola toda...?” Depois sorri. Sorri só.

Ondjaki. Bom dia camaradas. Rio de Janeiro: Agir, 2006. p. 136-137.

terça-feira, 29 de julho de 2008

Artsambique

Artsambique é um ótimo site voltado para a promoção e divulgação da cultura moçambicana.

Recomendo a visita:

http://www.artsambique.com/

Ricardo Riso

domingo, 27 de julho de 2008

Eduardo White - Dos Limões Amarelos do Falo às Laranjas Vermelhas da Vulva


http://loja.campo-letras.pt/prod_details.php?categid=92&productid=1493

«Todos os anteriores trabalhos de Eduardo White me sensibilizaram pela sua poética lúcida, simultaneamente bela e terna mas, em "Dos Limões Amarelos do Falo às Laranjas Vermelhas da Vulva" impressionou-me, particularmente, a crueza do desespero a que o poeta se abandona, e da sua impotência perante a imprevisibilidade do Amor. Considero-o um livro fascinante.» REINALDO RIBEIRO

PREÇO : €8.10
Preço de Mercado : €9.00
Sobre o Livro : «Lembro-te: alguém no amor precisa de estar nu para mostrar ao outro que está demasiado vestido.» EDUARDO WHITE

«A relação entre erotismo e poesia no livro de Eduardo White é tal, que pode dizer-se que o primeiro é uma poética corporal e a segunda é uma erótica verbal. A linguagem que nas páginas deste livro os combina é capaz de dar nome ao que é mais fugitivo e evanescente: a sensação.

É o movimento da imaginação que transfigura o sexo em lenta e parcimoniosa cerimónia e ritualiza ritmicamente, com sensualizado pormenor, a linguagem em metáfora.

O demorado percurso da inumeração das imagens poéticas é um abraço de realidades opostas, que se ajustam numa cópula infinita de sons, numa retórica em que o sublime se acaricia. Nestas páginas de intensidades luminosas, poesia e erotismo nascem dos sentidos, mas não terminam neles; ao desdobrar-se incandescentes, parágrafo a parágrafo inventam configurações imaginárias, celebram prazer e solaridade, um tempo único de entrega, eterno na sua demorada instantaneidade.

Desejo de volta à realidade primordial, ao êxtase de um corpo singularmente pluralizado, mulher e mátria, o poema concilia, em múltiplos acordes de separação e retorno, uma constante e ambígua fronteira, que permite a plenitude poética de uma apaixonada entrega amorosa.» ANA MAFALDA LEITE

«Eduardo White, um dos poetas mais loucos, mais lúcidos e mais angustiados que conheço. Mas um dos maiores poetas que conheço.» GLÓRIA DE SANT’ANNA


Outras Informações : ISBN: 978-989-625-308-0
Nº de Páginas: 56
Peso: 80 g.
Dimensões 13.5x21 cm
Ano de Edição: 2008

quinta-feira, 24 de julho de 2008

Elos de Moçambique

Desde o dia 21 de julho este blog integra o portal Elos de Moçambique, que agrupa os mais variados sites, comunidades e blogs ligados àquele país.

Para conhecer o portal, clique em http://groups.msn.com/MoambiqueELOS ou no selo que fica na parte superior da coluna à esquerda.

Ricardo Riso

segunda-feira, 21 de julho de 2008

Paulo Leminsky - Eu

Eu

eu
quando olho nos olhos
sei quando uma pessoa
está por dentro
ou está por fora

quem está por fora
não segura
um olhar que demora

de dentro de meu centro
este poema me olha


Fonte: http://www.jornaldepoesia.jor.br/pl.html#eu


Ando um pouco enrolado, afastado de poetas que admiro... como este aí de cima que me olha. Leminsky, Chacal, Cacaso, Torquato, Oswald, os irmãos Campos, Geraldo Carneiro, Ana C....

qualquer dia, escreverei sobre eles...

Ricardo Riso

sábado, 19 de julho de 2008

Mia Couto - A voz de Moçambique


Escritor africano lança novo livro e diz que a existência do português brasileiro foi fundamental para a auto-estima do povo moçambicano

Luiz Costa Pereira Junior

http://revistalingua.uol.com.br/textos.asp?codigo=11551

É uma metáfora poderosa a de que o escritor se anula ao criar uma história e volta a ser sombra quando a conclui. Essa imagem está em Terra Sonâmbula, o primeiro romance de Mia Couto, escrito há mais de quinze anos em Moçambique, e espelha o tom de respeito que o escritor dá à voz do outro, seja ele um povo desconhecido, seja um personagem de ficção.

António Emílio Leite Couto diz que desfia suas histórias quando presta atenção às figuras que inventa. Imagina o que diriam, quais seriam suas reações numa situação, o que diriam na intimidade, o que as levaria a agir. Esses movimentos, Couto os descobre devagar, que os sons da guerra ainda ecoam em sua mente, e a libertação de Moçambique do domínio português é recente, coisa de 1975. "Sou mais velho que meu país", diz.

Em junho, Mia Couto lançou no Brasil seu novo romance, Remédios de Deus, Remédios do Diabo (Companhia das Letras), uma viagem exploratória sobre a identidade e a velhice. Nascido em 1955, ele é biólogo e jornalista. Vive num país em que o português é língua materna de apenas 10% da população, lançam-se no máximo 40 livros por ano e há não mais de 11 livrarias, uma das quais em sua cidade natal, Beira.

Com o novo romance, são cinco as obras de Couto editadas no Brasil, um dos 21 países que o publicam. A mais célebre delas ainda é Terra Sonâmbula, seu romance de estréia, um primor de prosa poética em que conta uma história dentro de outra, como uma récita de contos.

Nesta entrevista, feita em São Paulo duas semanas após concluir o novo romance, em março, ele afirma que o povo moçambicano vivia o recalque de sentir que falava um português "errado" até perceber a experiência libertadora que é a brasileira. "O Brasil mostrou que não há português puro, e isso nos afirmou a identidade da língua portuguesa moçambicana."

Para Mia Couto, os moçambicanos aprenderam que, com o açúcar da sonoridade africana, o português, com eles, não é de má qualidade. Ganha antes elasticidade. E mais alegria.

Língua Portuguesa - Para você também vale o dito por Kindzu (de Terra Sonâmbula): quando você acende uma história, apaga a si mesmo?

Mia Couto - É mais que uma questão literária essa a de que devemos virar sombra para que o outro ganhe visibilidade para nós. Para que as luzes do outro sejam percebidas por mim devo por bem apagar as minhas, no sentido de me tornar disponível para o outro. Nós estamos tão cheios de nós próprios quando vamos ao encontro do outro que não temos a capacidade de captá-lo. É uma questão de fazer de nossa vida um rio de trocas para sermos mais felizes.

Como as técnicas da poesia ajudam a contar uma história?

A poesia para mim é uma maneira de olhar o mundo, de entendê-lo. É quase uma atitude filosófica. Poesia, a atitude, ajuda a criar enredos. Quanto ao resto, não ajuda. Porque o tratamento que é dado à linguagem é outro. O objeto sobre o qual a poesia trabalha é a própria linguagem. No romance, a linguagem não é o objeto central. Ela é muito mais um meio para construir a narrativa. Há aqui qualquer coisa que briga. Uma área assim em conflito me instiga, porque, no fundo, há que desmontar um bocado daquilo que são as idéias feitas sobre o que é poesia ou ficção. O escritor precisa ver onde está o limite entre uma coisa e outra e há de desmanchar esse limite, brincar com ele.

Você começa a escrever com a história previamente idealizada? Ou a inventa à medida que escreve?

Um livro nunca nasce de uma idéia única. Não sou capaz de fazer livros assim, isto de haver uma arquitetura prévia e o resto seria engenharia, digamos assim. Mas acabei de escrever Remédios de Deus, Remédios do Diabo, e quis me contrariar nessa idéia. Porque quero que um processo de criação me questione, de tal modo que, se fosse novamente desafiado, não saberia fazer outra vez do mesmo jeito, e não quero saber. Neste livro, resumi a história a três personagens e não deixei entrar nenhum outro. O processo caótico é muito estimulante, porque a certa altura os personagens nos controlam. Mas agora, não. Disse a mim mesmo que agora sou eu a estar no controle, a subir ao cavalo, a apanhá-los na rede e a não deixar entrar mais ninguém.

Como idealizou o livro?

Em Remédios de Deus, Remédios do Diabo, um médico português vai a Moçambique à procura de uma mulher pela qual se apaixonou. Chega à casa do pai dela, e é informado de que ela está provisoriamente fora. Vai ficando na casa, aproveita e trabalha no hospital da aldeia e vai se confrontando com o universo do lugar. Depois, um jogo de mentiras o obriga a ficar na vila. Neste livro, eu tinha dois personagens que me cativaram, dois velhos. Os velhos têm uma relação muito especial com o tempo, com a idade, com a morte. Há a idéia do convívio difícil que se transfere para a relação entre os dois, mas, no fundo, ambos estão com medo das mesmas coisas, cultivam os mesmos fantasmas. Esses são personagens que me fazem aproximar de uma história. Amo-os suficientemente para que me permitam que eu seja próximo a eles. É como se eu pudesse escutar a sua história, e eles me conduzissem para a sua narrativa.

Que obstáculos tem um escritor da África lusófona?

O fato de morar num universo periférico. A língua portuguesa não é já ela própria uma língua central. Mas pertenço a um mundo ainda mais exclusivo, quase um quintal. Muita gente não sabe nem o que é Moçambique, mesmo aqui no Brasil tenho de estar sempre explicando, e isso não ajuda. Talvez em alguns momentos possa ajudar, quando há a procura pelo exótico, por exemplo. Mas são instantes isolados.

Chegar ao Brasil é um obstáculo grande aos escritores africanos?

Há vinte anos, sim. Agora, mudou muito. Mudou em razão da relação brasileira com a África. Há coisas que o Brasil está fazendo de maneira mais concreta, que antes não fazia, para aproximar-se dos países africanos de língua portuguesa. Não só o Brasil, mas nós próprios também. Nossa atitude mudou. Os africanos eram muito apelativos: "Olhem para nós, porque estamos sofrendo". Isto não resulta. Há que nos empenharmos em produzir uma linguagem distinta, em criar uma alma que não instiga essa relação de compaixão ou solidariedade, mas seja afirmativa. Não é pela solidariedade que a arte ou a literatura em Moçambique vai conquistar o seu lugar, onde quer que seja.

Há especificidades nas literaturas lusófonas? Que tipo de marca se vê só no texto brasileiro, só no português e só no moçambicano?

Sim, há. Isso está muito marcado com as diferentes relatividades dos lugares. A relação com a morte, com os deuses, os nossos medos profundos. Não é uma coisa só literária, tem a ver com o espírito do lugar. A maneira como portugueses são marcados pelo catolicismo, digamos, mediterrânico; os brasileiros, por alguma área sincrética entre a herança africana e o catolicismo; e os africanos, que têm o peso brutal dos antepassados sobre si. Isso tem conseqüências fundamentais na literatura, na maneira de sentir o mundo, de pesar os sentimentos. Falamos com os mortos de maneira diferente e por isso escrevemos para os vivos de modo distinto, mesmo na mesma língua.

Como vê a condição internacional do português?

O que posso dizer? Tudo depende da maneira como Brasil e Portugal se vão entender e adotar uma postura que seja produtiva, virada para o futuro, e acima das disputas por hegemonia em torno do português que falamos.

A liberação do domínio colonial provoca algum tipo de aversão ao idioma português em Moçambique?

Isto não existe e, se há, é fruto de uma minoria muito, mas muito pequena. O português tem cada vez mais transitado de língua oficial para a de cultura. Quando Moçambique se tornou independente, em 1975, só 2% da população tinha o português como língua materna. Agora, são mais de 10%. Todos os escritores moçambicanos escrevem em português porque sentem, sonham em português.

Há contradições do português no convívio com os idiomas nativos?

Há áreas de conflito. As línguas têm sempre uma vocação hegemônica e é preciso cuidado para que não ocorra lá o que ocorreu no Brasil, onde os idiomas nativos foram dizimados. Em Moçambique há a preocupação com as mais de 20 línguas locais, para que não fiquem subalternizadas e depois morram. Nasci em língua portuguesa, com 5 anos falava xissena, que é o idioma de minha terra natal, Beira. Agora falo mal e entendo razoavelmente bem o idioma do sítio em que vivo em Maputo, que é o changane.

As diferenças entre o português africano e o brasileiro repercutem em alguma medida na forma como se cria ficção aqui e em Moçambique?

Acho que não afetam, no sentido de perturbar. Alguma arrumação da gramática brasileira tem muita influência da estrutura das línguas africanas. O modo como vocês usam o reflexo, por exemplo, também ocorre no português moçambicano, no de Angola. "Eu o vi" não é correto segundo o padrão europeu, mas sim "eu vi-o". Em Moçambique, pessoas que nunca conviveram com o Brasil, dizem "eu o vi". Uma das razões de Jorge Amado ter cativado a África lusófona foi nos ter apresentado personagens falando o português coloquial do Brasil. A adesão imediata foi porque nós também falamos daquele jeito. E percebemos que não é errado. Sempre nos diziam que falávamos errado, mas aí começamos a dizer: "O brasileiro também fala assim".

A literatura brasileira teria, então, ajudado a "abonar" o português moçambicano?

Sem dúvida. A descoberta do português brasileiro foi fantástica. Porque mostrou que nós precisávamos ver o português sem Portugal, um português que mostrasse que havia pluralidade, outras culturas que manejam o idioma com a mesma dificuldade e a mesma alegria.

Como o acordo de unificação ortográfica é visto em Moçambique?

De uma maneira muito displicente. Percebe-se que não é isso que falta, nem que vá resultar grande coisa. É como se fosse uma questão só de Portugal e Brasil. Meus livros são publicados no Brasil com grafia moçambicana, que é portuguesa, e ninguém me disse que ficou muito atrapalhado com isso. Leio com enorme prazer os livros brasileiros e um dos prazeres é o fato de vocês terem uma grafia distinta. A existência dela não é problema, pois sentir certa falta de familiaridade mostra que ali está um outro povo, uma outra cultura falando.

Quais diferenças do português falado em Moçambique e no Brasil que mais saltam ao seu ouvido?

Além do uso do reflexo, há o gerúndio, por exemplo. Vocês têm o gerúndio muito presente, o "estou fazendo"; nós temos a forma composta "estou a fazer", que também dá idéia de continuidade, mas não é construída na mesma forma verbal.

O Brasil influencia o léxico moçambicano?

Há coisas mais gritantes, como "bicha", que para nós é "fila", e está morrendo, porque nas novelas brasileiras, muito vistas lá, o sentido é de homossexualidade. Expressões como "estou na bicha" estão sumindo nas cidades, não tanto no meio rural. "Todo mundo" é uma coisa brasileira. Há dez anos, dizíamos "toda a gente". "Visual", da expressão "mudar o visual", também não usávamos.

O curioso é que, logo após a independência, havia uma postura preconceituosa em relação ao português do Brasil. Estive numa reunião, não lembro se em 1976, 77, em que os pais protestaram contra um brasileiro que ia ensinar português na capital Maputo. "O português do Brasil não é o verdadeiro português", diziam. Mas não só a TV mudou essa imagem, como os jovens moçambicanos, que vieram estudar no Brasil, e os brasileiros, que por Moçambique passaram. Depois desses contatos, percebeu-se que não há um português puro.

Vocês se incomodam com estrangeirismos, que aqui no Brasil são vistos por muitos como um problema?

De modo algum. É preciso notar que o português em Moçambique é uma segunda língua. E na sua língua materna, o moçambicano já faz a sua ginástica de incorporar termos de outros idiomas. O que o português chama de "poltrona", em Moçambique é um "estuo" em changane, que vem de stoel, "cadeira" em holandês. Os óculos recebem o nome de "glase", do inglês glass. As línguas nativas têm toda a liberdade de buscar novos termos onde quiserem. Não havia palavra para nomear artefatos modernos pós-colonização, daí africanizá-los como necessário. É um contra-senso defender a pureza do idioma num sítio desses.

A literatura brasileira influenciou sua obra em algum sentido?

Tudo o que li ficou em mim. A literatura brasileira ficou muito conhecida lá, e mais querida que a portuguesa. Na geração dos anos 50, 60, era um entusiasmo. A partir dos anos 80, depois da independência, curiosamente, aquela ligação foi perdida. Hoje não se conhece quase nada por lá, à exceção de Paulo Coelho, que não sei se pode ser chamado de escritor.

Como a literatura moçambicana evoluiu? Ganhou vigor ou é marcada por casos pontuais?

É muito difícil falar de uma literatura moçambicana, como um todo lógico. Há escritas moçambicanas, não uma literatura. Isso pede tempo e nós perdemos umas duas gerações com a guerra. A escola, que era um elemento de ligação com o livro e a língua, morreu por quase vinte anos.

Há literatura lá que não seja em português?

Houve uma tentativa, mas fracassou. Foram publicados dois livros em tsonga, e disseram que venderam menos de dez exemplares cada. Não basta só a oferta, é preciso um trabalho de base que tem de passar pela escola, pela fixação da língua escrita.

Como vê o mercado consumidor de literatura em língua portuguesa?

Eu não o conheço bem. Mas me surpreendi que, em proporção, as tiragens em Portugal são muito mais altas que as do Brasil. Há edições com médias de 50 mil a 60 mil exemplares por lá, o que no Brasil é impensável. E olha que Moçambique tem uma taxa de analfabetismo altíssima. Em todos os países, há autores de enorme sucesso que não são bons e outros com prêmios que não vendem muito. Não sei nem se os próprios editores entendem bem o que se passa nesses mercados.

Certa vez você declarou que Moçambique vivia um eterno "momento de trégua", indeciso entre "o horror da guerra e o terror da paz". Como vê seu país hoje?

É um país que está em estado de ficção. E é muito jovem. Moçambique está agora a tentar encontrar um espaço de comunhão. Sou mais velho que meu próprio país, veja só. Há processos que se sedimentarão com o tempo. Tenho certeza de que iremos nos encontrar e, como fazem as famílias, nos juntaremos para fazer um retrato e dizer: "isto é Moçambique".

sexta-feira, 18 de julho de 2008

África e Africanidades - chamada para artigos

A Revista África e Africanidades, publicação on-line com periodicidade trimestral, recebe artigos e resenhas para avaliação e publicação em sua próxima edição (setembro) até o dia 30 de julho.

Veja regras para envio no site http://www.africaeafricanidades.com/

domingo, 6 de julho de 2008

Feliz Aniversário!!!!


O blog Riso – sonhos não envelhecem comemora o seu primeiro aniversário no dia de hoje.

Até hoje, foram 367 visitas ao meu perfil, o que confere uma média pouco superior a um visitante/dia.

Para o segundo ano de existência, espero continuar com a minha proposta em divulgar os autores de literaturas africanas de língua portuguesa, assim como demais assuntos culturais.

Agradeço a todos que visitam o blog, deixam seus recados aqui mesmo, no Orkut, ou mandam mensagens para o meu e-mail. Agradeço, também, aos que passam por aqui e não deixam seu registro.

Obrigado,
Ricardo Riso

sábado, 5 de julho de 2008

Impressões sobre Pepetela na Flip

Encerrada há poucos instantes a mesa Guerra e Paz, com o angolano Pepetela e a nigeriana Chimamanda N. Adichie, mediada por José Eduardo Agualusa. Como não poderia deixar de ser, a experiência da guerra em ambos os países e a relação dos escritores com o conflito preponderaram durante a palestra.

Após a leitura de trechos das obras publicadas recentemente em nossa país, Pepetela com Predadores (em que homenageou Jorge Amado) e Chimamamda com Meio sol amarelo, Agualusa citou o livro Mayombe, que retrata os conflitos internos entre os angolanos no período final da guerra contra o colonialismo português, para que Pepetela contasse a sua experiência como guerrilheiro. À Chimamanda, o mediador pediu para relatar as conseqüências que a guerra entre a Nigéria e a Biafra causou em seu povo e na sua vida.

A nigeriana contou que não vivenciou o conflito, nasceu após o seu término, mas a guerra esteve presente entre os seus familiares mais velhos. Desde a tenra idade, sempre demonstrou interesse pela maneira como as pessoas lidavam com as adversidades impostas pela situação. Frisou que seu interesse maior era como as pessoas se relacionavam, como criavam seus filhos no decorrer de tantos anos de dificuldades e escassez de alimentos. Para Chimamanda, era necessário conhecer as histórias de vida de quem sobreviveu nesses anos cruéis.

Já Pepetela, aproveitando as situações-limite retratadas em Mayombe, comentou que para quem participou de tais momentos não podia demonstrar fraqueza, devia radicalizar suas posições e mostrar bravura a todo instante. Apesar de todos os guerrilheiros terem em comum o medo.

Em outras passagens, Pepetela narrou com humor como o acaso fez com que passasse de jornalista a guerrilheiro. Relatou como um comandante tinha que agir para ser respeitado, pois havia a crença que um líder deveria ter o “corpo blindado” (o nosso “corpo fechado”) e o inusitado dessa situação. Embora alguns comandantes se declarassem marxistas e ateus, eles passavam pelos rituais religiosos para “blindar” o corpo. Com isso, adquiriam o respeito dos guerrilheiros.

A respeito da época atual, Pepetela valorizou a paz em uma terra que vive em conflito há cinco séculos. Afirmou que “é mais fácil convencer militares da importância da paz do que convencer políticos”. Porém, o preocupa as desigualdades social e econômica em Angola, e que o desafio para o país é buscar alternativas para reduzi-las. O escritor também manifestou pesar pelo crescente retorno do racismo entre os seus compatriotas.

Em relação ao contato entre os escritores africanos, Pepetela mencionou a dificuldade entre os autores conhecerem-se, pois o mercado editorial dos países africanos ainda é pequeno e o contato entre eles, raro. Comentou que conhece livros de autores africanos quando são publicados na Europa e conhece pessoalmente seus autores em feiras naquele continente, ou como na Flip.

Da nova geração de escritores angolanos, elogiou Ondjaki (Bom dia camaradas e Os da minha rua foram lançados no Brasil), que estava presente, entretanto, percebe que há pouco domínio da língua portuguesa na nova geração, apesar de reconhecer boas narrativas e histórias entre os jovens. Citou que há o predomínio do português em relação às outras línguas, que provavelmente ficará uma lacuna não preenchida na literatura angolana, pois os escritores da sua geração, que possuíam maior domínio das outras línguas, pouco as utilizaram como língua literária. E, agora, são raros os jovens que falam uma língua nacional.

Bom, foi o que considerei importante na fala de Pepetela. Agora, aguardo o dia 08/07 para o lançamento de Predadores, na Livraria Argumento – Leblon.

Riso

sexta-feira, 4 de julho de 2008

Mia Couto e a CPLP: Moçambique é e não é país de língua portuguesa

http://www.jornalnoticias.co.mz/pls/notimz2/getxml/pt/contentx/189223

ENTREVISTA - MIA COUTO E A CPLP: Moçambique é e não é país de língua portuguesa

Maputo, quarta-feira, 25 de junho de 2008
Entrevista concedida a Gil Filipe

MIA Couto apresentou recentemente em Maputo o seu mais recente livro, o romance “Venenos de Deus, Remédios do Diabo”. É o 23º deste que é o autor moçambicano mais lido interna e externamente. As vendas no país e as traduções para inglês, francês, italiano, espanhol, alemão, dinamarquês, hebraico... são o espelho do quão apetecível é este escritor. O novo livro marca uma certa viragem na escrita de Mia Couto: se ele se fez famoso numa carreira de quase três décadas inventando palavras – é conhecido como “o inventor da língua” –, nos venenos e remédios que agora oferece à literatura a faceta já não é essa. É simplesmente a de um imaginativo comunicador, contador de uma história desdenhável à priori mas que com o fluir das páginas se revela apetecível, porque nos faz debater o que pensamos saber mas que na verdade... ignoramos. É assim este “Venenos de Deus, Remédios do Diabo”, chamamento a um diálogo praticamente inexistente: o diálogo entre nós e os outros, por exemplo os países de língua portuguesa, por via da cultura. A saída deste livro foi um novo pretexto para uma nova conversa com Mia Couto. Falámos de literatura e de outros temas inevitáveis quando se está por estes dias perante um actor importante na língua que também é nossa: o andamento da CPLP e o polémico acordo ortográfico. Eis alguns trechos dessa conversa com o também autor de “Terra Sonâmbula” e “ Varanda do Frangipani”: Maputo, Quarta-Feira, 25 de Junho de 2008:: Notícias

- Pelo que percebi percorrendo as páginas de “Venenos de Deus, Remédios do Diabo”, este livro é uma viagem à uma outra vertente da cultura, como os encontros e as divergências de perspectivas de ver o mundo, de procuras e encontros de identidade... É isso?

- Eu acho que desde o meu primeiro livro há um tema que nunca me abandonou que é o tema da procura de identidades. Estas identidades que nós pensamos como sendo puras, isoladas e estáticas, não são nada disso e pelo contrário são dinâmicas. Este livro fala um bocadinho sobre isso, sobre uma mestiçagem que não é apenas racial mas uma mestiçagem de culturas. Evidentemente que a história é uma outra coisa, mas de uma forma indirecta falo também sobre isso.

- Falando essencialmente deste livro, exactamente o que são, na perspectiva de quem escreveu, estes remédios e estes venenos?

- É uma história de encontros e desencontros, de alguém que pensa que vai encontrar alguém, e que não encontra, e que pensa que vai encontrar numa determinada terra, que lhe aparece na aparência, é uma outra coisa. Quer dizer, esta terra é uma espécie de cenários, de imagens e de representações que são sempre falsas. Portanto, há aqui uma fabricação de mentiras, pois para existir esse lugar é preciso mentir sobre si próprio. Aqui há uma família que vem de fora e que tem que construir uma encenação para conseguir o tipo de relação com essa pessoa que vem de fora. Este livro nasceu quase acidentalmente. Estava eu a escrever outro livro, que acabei adiando, quando me surge a ideia desta história. Foi por acidente que saltei para esta história, pequena e que foi crescendo, que começou a chamar-me, a prender-me e de repente fiquei nela e abandonei o romance logo que tenho e que vai sair posteriormente.

- Naquilo que é a obra, deparo-me com dois factos: o primeiro é que sempre que escreve é atrás de um tema. E segundo é que esse tema tem a ver com um espaço específico, Moçambique. Mas nota-se agora a ausência disso. Estará o novo romance a marcar uma viragem na sua escrita?

- Como tu podes imaginar, quando se chega a determinado estágio daquilo que é o nosso percurso – este é o meu 23º livro -, há uma tentação enorme em escrever mais um livro. O risco é esse, sentir-se sempre tentado e a fazer mais um livro e encarar isso de uma maneira quase banalizada, pois perdemos aquela atitude e aquela paixão intensa que marca o primeiro livro, o que é grave. Substituímos esse pensamento e sentimento pela procura do tal livro que nem sequer sabemos o que é e como é que o devemos escrever. Portanto, eu quis que este livro trabalhasse dentro de mim como uma surpresa, rompendo com algumas coisas e com algumas linhas que eram linhas minhas habituais. Este é um livro mais ou menos universal, portanto esta história podia ocorrer em qualquer lado do mundo e também menos crível a factos históricos, embora aqui, curiosamente, apesar de estar a navegar um pouco pelo mundo faço uma coisa que nunca fiz, como pôr referência de lugares precisos, como, por exemplo, Murébuè, Pemba, o que nunca tinha feito anteriormente, embora me referisse a Moçambique pelo contexto mas pondo lugares fictícios...

- perguntava se é uma viragem, essa, na sua escrita? É assim que passará a escrever?...

- Sim, há um bocado de viragem, mas não sei se é exactamente assim que passarei a escrever. Não sei, não sei. Apenas quis soltar-me de algumas coisas e no domínio da construção da linguagem eu faço uma coisa que eu penso que é nova, como, por exemplo sou mais comedido na invenção de palavras, fazendo-o só quando era preciso e não como um factor de busca literária ou marca. Por outro lado, o lugar do narrador é um lugar que aparece pela primeira vez num livro meu como personagem também; ele entra na história, tem opiniões, dialoga com as outras personagens, o que faz com que a fronteira entre o narrador e os outros intervenientes da história é sacudida.

- Quando fazemos algo durante um longo fio de tempo corremos o risco de ser monótonos e não causar impressão aos receptores do nosso trabalho. Por isso procuramos desafios. Quais são os seus, depois de mais de 20 livros?

- Olha, eu fico sempre com o sentimento, com a impressão de que ainda não escrevi o tal livro que eu quero escrever. Esse é um fenómeno existente e penso normal junto de quem abraça a escrita. De qualquer maneira não me sinto satisfeito, há em mim uma intranquilidade e uma inquietação que nos faz correr para além do que já fizemos. Acho que isso é que nos move não como escritor mas como pessoa, pois todos nós estamos sempre à procura de uma coisa que está sempre mais além e mais além...

- ... mas tem algumas ambições na carreira...

- Não, não! Não tenho ambição do ponto de vista de carreira. Mas gostava de manter comigo próprio uma relação em que possa inventar mais. Eu penso que há mais coisas que eu posso inventar, mais personagens, mais vidas que eu posso criar dentro de mim. A felicidade que a escrita me dá vem sobretudo do facto de eu poder ser outro, ser determinado personagem que eu próprio criei, e, como podes imaginar, isso não tem fim, eu quero ser infinito e quero ser eterno. Encontrei uma maneira de mentir a mim próprio me multiplicando em pessoas e em personagens que eu vou criando.

- O facto de ser o escritor moçambicano mais lido aqui e no estrangeiro, lá por via das várias traduções aos seus livros, cria-lhe alguma pressão, satisfação ou algum outro sentimento?

- É uma mistura de sentimentos. É assim: há alguma coisa que me dá prazer nisso, eu tenho algum orgulho e alguma vaidade pelo facto de que esse reconhecimento me foi dado. Às vezes fico muito comovido, na rua por exemplo, quando muita gente, que provavelmente nunca leu os meus livros mas que me dizem coisas como “você é uma espécie de bandeira nossa, continue...” Encaro isso como mensagens de grande gratidão da parte das pessoas que assim se pronunciam e fazem de mim uma pessoa grata por tudo o que tenho vindo a fazer. Às vezes pergunto-me a mim próprio se eu mereço isso. Mas por outro lado sinto isso como uma responsabilidade que eu acho que não quero ter, eu não posso definir-me a mim próprio como sendo representante de alguma coisa. Tenho todo o prazer em que o meu nome esteja associado ao nome do país, de uma terra que ainda tem que se afirmar, e me orgulho por isso. Mas não estou em lugar cimeiro de nada, olho para mim como um aprendiz que se sente no princípio da sua própria carreira. Estou disponível para aprender e para rever a mim próprio, porque o que fiz já não conta, conta o que tenho ainda a fazer, estando aí a beleza de ser escritor.

- EM 2007 dismistificou a ideia de lusofonia, um conceito por vezes polémico ou mesmo ignorável pela forma como tem sido definido. Qual é a sua percepção sobre a tal comunidade de países de língua portuguesa?

- Bom, há uma organização que se chama CPLP, que está fazendo coisas, reúne-se, tem comissões de trabalho, etc., e eu acho que por aqui essa organização existe e ninguém pode negar. E depois existe outra coisa que se pode questionar que é se isso tem correspondência de uma comunidade de afectos, de uma comunidade de interacção. E eu acho que esta existe também, não da maneira como os políticos a querem apresentar mas existe. A língua portuguesa deu-nos uma certa afinidade histórica. Aqui na língua temos que ter algum cuidado, porque se queremos construir uma família, uma comunidade... Temos que pensar que alguns moçambicanos, alguns angolanos e alguns guineenses, não falam português. Há outros casos, também, como o de Timor Leste, em que dizemos falsamente que é um país de língua portuguesa. É uma coisa falsa e desorientada politicamente e culturalmente dizer que aquele país é de língua portuguesa. Timor não é um país de língua portuguesa nem a maioria dos timorenses fala português.

- Por esse andar é correcto definir Moçambique como um país de língua portuguesa?

- Moçambique é um país que é de língua portuguesa! E não é ao mesmo tempo. Alguns moçambicanos é que pertencem à esse universo, o de terem a língua portuguesa como o seu veículo de identidade, de afirmação cultural, etc. São poucos os moçambicanos que falam, escrevem, sonham, amam na língua portuguesa. E não são menos moçambicanos por isso nem os outros mais moçambicanos pelas outras línguas que usam. Eu acho que há aqui uma tentativa de procurar a identidade moçambicana sempre lá, nas raízes, há séculos, quando provavelmente tiveram a mesma mobilidade, como o changana que existe hoje não é o mesmo de há 50 anos ou antes da chegada dos ngunis. Portanto, eu acho que essa comunidade, a de língua portuguesa, existe de facto. Penso que a questão a colocar por volta dela é se ela é mesmo aquilo que nós queremos que seja. Eu acho que o grave é haver manipulações...

- ... da parte de quem?

- Da parte dos que querem ser mais que os outros, dos que disputam os outros! Eu acho que a disputa é entre Portugal e Brasil, que querem usar esta bandeira como instrumento de busca de privilégio na relação com os outros países de língua portuguesa. E às vezes há aqui uns lapsos de língua quando eles se referem aos outros como os lusófonos, quando os portugueses falam em “países lusófonos” excluindo-se eles próprios e querendo referir-se apenas a nós, países africanos de língua portuguesa. Às vezes estabelecem um eixo triangular da lusofonia, composto por Portugal, Brasil e depois África, como se nós não tivéssemos direitos a nomes próprios como países. A lusofonia de que se fala tem sete ou oito países, contando com Timor Leste. Mas também não vou ficar a aceitar a alguns pronunciamentos que se fazem entre nós. Eu sou adepto da crítica, desde que devidamente fundamentada.

- A comunidade de língua portuguesa é então utópica, existindo muito pouco na prática, por essa ausência de entendimento e por esse contínuo digladiar de gigantes que nos querem definir em função dos seus interesses...

- Penso que fazer uma recusa total da lusofonia, de uma comunidade de falantes de língua portuguesa no mundo, de que nós fazemos, parte, não é correcto. Porque essa comunidade pode nos servir em muitos momentos, como o que mais ou menos se verifica agora, em que o processo de globalização é muito forte e nos pode sufocar. Talvez essa afirmação de um espaço próprio, onde nós temos alguma coisa a dizer, é bem mais útil que as perdas de tempo que temos tido ao rejeitarmos aquilo que por razões óbvias não se pode rejeitar. Não nos esqueçamos que com o Brasil temos afinidades históricas importantíssimas que muitas vezes esquecemo-nos que elas existem e que são intrínsecas à existência de todos nós. Há coisas que nós devíamos recuperar e valorizar historicamente e se calhar isso nos criaria um espaço de afirmação e de negação dessa globalização e de homogeneização do mundo que me parece se está a tentar construir por algumas correntes de pensamento e de atitude.

- O que está a dizer é que é importante haver uma organização como esta mas operando de um modo que não é o que caracteriza o agora andamento da CPLP...

- Não sei se é isso, mas penso que isso é outra coisa. Não vou avaliar a qualidade do funcionamento da organização, mas sinto que ela é pouco visível, é pouco participativa e apela muito pouco para que nós participemos nela, por exemplo para aquilo que possam ser as nossas sugestões. Eu acho que também aqui ao invés de ficarmos no café ou no sofá a dizer mal, se calhar devemos levantar as nossas vozes para dar a sugestão de como é que gostaríamos que fosse esta organização que pretendemos seja mesmo uma comunidade de países.

- Outro ponto que suscita debates no seio dos países que usam o português como língua oficial é o acordo ortográfico. Temos nós e Portugal um código de escrita, o Brasil o seu... A harmonização trás um braço-de-ferro entre Portugal e Brasil, que tentam arrastar os outros para a sua filosofia. De que lado é que está?

- De nenhum! Estou do lado de Moçambique. A minha opinião é uma opinião de escritor e de cidadão. Eu nunca tive problemas em ler livros brasileiros. A grafia ligeiramente diferente não me faz confusão. O Brasil lê os meus livros e lê os livros da Paulina Chiziane sem problema nenhum. Pelo contrário acho que há da parte dos brasileiros um certo encanto ao se aperceberem que se trata de uma realização linguística diferente. Portanto, não penso que seja de grande importância a questão do acordo ortográfico. Mas respondendo à sua pergunta, não faço guerra contra o acordo mas não sou a favor dele. Eu acho que o importante era discutir outras coisas que nos afastam e mantêm o enorme desconhecimento que há entre nós. O Brasil não sabe muito de Moçambique. Portugal idem. Eu acho até que os moçambicanos sabem muito mais sobre os outros do que os outros sabem sobre nós. Os moçambicanos são mais atentos em relação ao mundo e têm a capacidade de olhar para o mundo de uma maneira muito mais crítica, no sentido de conhecê-lo e por isso estarem dotados de opinião credível, o mesmo não acontecendo com muitos daqueles com quem nos relacionamos.

- Dizia que o mais importante não é o acordo. É...

... é e são muito mais coisas como estas que eu estava a enunciar. No domínio da cultura há muito mais a unir-nos e a afastar-nos. Há acções culturais que temos que fazer para que os livros circulem melhor entre nós, o que francamente não está a acontecer agora. Com uma ortografia ou outra se não mudarmos essas coisas não estaremos a caminhar juntos. A importação do livro deve ser repensada, porque não é fácil sobretudo para nós, os mais pobres. Deve-se pensar nas edições conjuntas, divulgação do que é que estamos a fazer, o que é que é a história comum destes povos, os seus patrimónios de identidade comum desses povos, tudo isso é mais importante que tentar buscar um acordo para a ortografia da língua.

quarta-feira, 2 de julho de 2008

Pepetela na Livraria Argumento - Rio

Prosa Nas Livrarias (Leblon)

08/07 (3ª feira) às 19h

A Livraria Argumento Leblon e o Prosa & Verso, do Jornal O Globo, apresentam a Prosa nas Livrarias com os autores Pepetela e a portuguesa Inês Pedrosa.

Local:
Livraria Argumento
Rua Dias Ferreira, 417 - Leblon

http://www.livrariaargumento.com.br/

terça-feira, 1 de julho de 2008

FLIP ao vivo, em blog e no You Tube

FLIP 2008
2 a 6 de julho


FLIP - Festa Literária Internacional de Paraty ao vivo


Buscando atender ao constante crescimento de público, este ano a FLIP terá transmissão ao vivo na internet para todas as mesas. A inovação permitirá que qualquer pessoa possa acompanhar através do hotsite www.oi.com.br/flip os debates dos autores em tempo real.

FLIP terá blog e página no YouTubeVídeos e textos sobre a programação da Tenda do Autores, FLIP ETC., FLIPINHA e bastidores da FLIP serão este ano publicados no blog oficial da FLIP - http://blogdaflip.wordpress.com/ - e no canal FLIP no Youtube - http://br.youtube.com/user/flipfestaliteraria. O conteúdo começará a ser disponibilizado na quarta feira, 2/7, com a cobertura da conferência “A poesia envenenada de Dom Casmurro”.
Fonte: e-mail enviado pela organização da Festa Literária Internacional de Paraty, no dia 1 de julho, às 11h59.